quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Sobre inquietações


Microconto  
(Por Cláudia Vanessa Bergamini)
Cleuza não sabia nada sobre amar, sobre carinho, sobre doação... Tola que era só sabia sobre si e sobre o que lhe ensinara o dicionário. E ele foi majestosamente lhe mostrando o verdadeiro conceito de carinho.


Microconto 
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Naquela manhã, ao acordar, ela entendeu que são os pequenos gestos os responsáveis por grande felicidade. 


Microconto
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Sentaram-se os dois. Entregaram os documentos, ouviram, falaram e, menos de uma hora depois, está consumado. E ela pensou: e agora o que faço? Nada, apenas respire!


Sobre relações e flores... 
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Muito se faz enquanto se aguarda por um atendimento. Não roí as unhas, ainda que tenha andado ansiosa, não perdi a paciência, embora o tenha feito com intensidade considerável nos últimos tempos. Enquanto aguardo, recebi flores. Flores lindas. Orquídeas. Belas, de uma beleza delicada, pura, suave. Colorida, de uma cor única, vibrante. Branca, alva como alvo é o amor que me tem tomado. Enquanto olhava para as flores que a mim foram enviadas, e como para mim é custoso não me deixar tomar por sensações e transpô-las ao papel, comecei a pensar na intensidade dos sentimentos humanos. Pensei em como as relações são como flores, vivas de cores, leves ao toque, belas e encantadoras ao olhar. Pensei também que, à medida que as flores envelhecem, vão perdendo seu vigor. Assim são as relações, o tempo mata o vigor, o desejo, as vontades e até o respeito. Já vivi uma relação assim. Agora o que tenho tentado construir é uma relação que, como as flores, ao simples sinal de envelhecimento, renova suas folhas e logo nos oferta uma nova flor ainda mais bela. Quero uma relação igual. Se vier o amarelecimento, deixarei que a vivacidade das cores venham encobri-lo. E ainda mais desejarei ofertar o que há de flor em mim e colher de ti o que há de raiz forte e vivaz.



Não há resquícios
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Quantos são os momentos em que um texto, uma fotografia ou palavras imortalizam o vivido?
Quantos são os momentos em que o cheiro, o toque, o sabor materializam as sensações?
Quantos ainda são os momentos em que as mãos se tocam a dizer muito mais do que vãs palavras?
Não! Não me perguntes sobre fotos.
Não me perguntes sobre vídeos, tampouco sobre palavras escritas com zelo e amor.
Perguntes-me sobre tudo o que apaguei,
perguntes-me sobre tudo o que foi excluído.
Se vieres a mim e de fato perguntares,
responder-te-ei que não há resquícios,
não há um vestígio sequer.
Tudo, a mais sublime palavra, o mais lindo dos textos, a bela poesia que dança como valsa nos olhos da menina,
fora tudo apagado.
Então, por acaso não há mais nada a guardar?
Ledo engano!
Há muito mais do que palavras,
há muito mais do que poesias, pois,
ainda que não exista o cheiro real, o toque real, o calor real,
tudo está guardado em meu coração.
As lembranças dançam a dança sensual da memória,
as imagens materializam-se ao fechar dos olhos,
os sons adentram o universo imaginário e penetram no mais íntimo do ser.
Eu não preciso de nada concreto!
Eu não preciso de lembranças tocáveis.
Tu não sabes o quanto me habitas,
tu nem desconfias das memórias que guardei.
Peças e eu te atendo.
Chames e eu te sigo.
Mas não ordenes que apague de mim os calores que senti,
os sonhos que criei,
os paladares que imaginei,
os toques que em devaneios concebi.



Pragmática
(Por Cláudia Vanessa Bergamini)
E os sonhos vão,
pouco a pouco,
desmantelando-se
e a realidade,
paulatinamente,
vai desnudando-se!



O sol 
(por Claudia Vanessa Bergamini)
Hoje eu não quero a lua mais brilhante, nem a rosa mais linda. Hoje já nasceu para mim o Sol.
Soberano, porque sabe ser único, doce, porque sabe que há uma vida a adoçar, firme na postura, porque sabe que precisa ensinar, paciente, porque há ainda o dia a domar.
Quando o sol empresta seu calor à rosa, perde parte de sua energia.
No entanto, visita o jardim pouco a pouco até colher dela o orvalho matinal, empresta sua temperatura a ela, e esta lhe agradece com sincero desabrochar.
Ao passo que o Sol aquece o dia, com seu brando calor, vai permitindo uma ebulição de sentires, de quereres...
Conhecedor que é da rosa, a acalenta com calor suave
e, às vezes, paternal em cuidados.
Em outros momentos, põe-se sol vibrante, dono, possuidor e, em tais situações, a rosa lhe faz honras e reconhece que sua presença como sol, seja brando ou feroz, brisa mansa ou tempestade, é basilar.


Desejo 
(por Claudia Vanessa Bergamini)
O amor vai invadir de paz o coração tao talhado pela guerra. Vai entrar pela janela e iluminar o sorriso.


Ode aos sessenta dias
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Em que tempos andava
que não te encontrei,
em que rostos mirava
que o teu nunca vi,
em que caminhos cruzava
que teus passos não percebi...
em que mãos segurava
que calor não senti,
para que olhos olhava
se brilho neles não vi,
que calor eu buscava
se me aquecer não consegui...
O tempo continua a passar
Um rosto somente desejo mirar
e há uma vereda a se cruzar.
Se por acaso não sei
Talvez por destino, pensei,
Uma sina a viver
Sem a qual não se pode ser.
Acho um ano em sessenta dias
Mas na ausência dos olhos reais,
o tempo corre lento e demora mais.
De rimas não gosto
Mas aqui estou eu
contando com gosto
de dias tão meus.
Do sorriso e da festa
que há em meu coração
do desejo que em mim habita
e não quer sair não.
Amo-te em alegria
Amo-te em tristezas
e a cada dia
disso tenho certeza
Se em versos eu quero
expressar o que sinto
é porque em invernos
sempre te esperei, não minto.


Ruídos
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Há ruídos intensos
Há ruídos menores
Há aqueles insistentes
e outros latentes...
Piores são os ruídos silenciosos do eu,
aqueles que nos ferem em fogo,
que nos cortam com lâmina nobre,
que nos sugam como força imensurável.
Para muito além de pequenas manifestações sonoras,
o ruído é som estridente,
que, como sarça ardente,
nos penetra e nos corta de forma demente.


A palavra
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Amo as palavras!
De pequena, aprendi a fazer delas minhas companhia.
Ainda guardo o caderninho com capa marrom em papel camurça
no qual desenhei as palavras que me eram impossíveis de dizer.
Jogo com elas o jogo da enunciação
e escolho o que devo enunciar após o momento de silêncio.
Tenho tantas palavras dentro de mim que, por vezes,
sinto que não sei segurar a ansiedade em dizê-las.
O verbo,
o sentido do verbo,
a interpretação do verbo.
Palavra é o sentir em matéria,
Palavra é o sentir em dor,
é o sentir em si o que já sentia,
mas se desejava ocultar.
Gosto de pensar nas palavras doces,
gosto de lembrar da sensação que o som de algumas delas, quando ditas, me provocaram...
mas estas quedaram-se tão distantes, tão inertes diante da vida.
Ouço palavras, digo palavras, vivo palavras, sinto palavras.
O verbo é a essência
É aquilo capaz de movimentar o interior do ser,
e que tem me movimentado de uma forma acelerada,
gerando uma sonoridade infinita.
não há ecos do que já ouvi e gostei,
antes, porém, há o tilintar do que desejo olvidar.
Cada vez que as palavras me faltam aos lábios
é porque dentro de mim elas se colocam inertes,
cada vez mais eu falarei com menos palavras
porque acima de tudo ainda há ecos que rondam meu coração.
Muito mais do que palavras é pelo silêncio que me expressarei.

Fim 
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Todas as flores murcharam
A água secou
O sonho acabou
A dor permaneceu

Fim I 
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
No ritmo da música se embala a criança
até que um dia ela cresce
e a música já não a convence mais

Fim II 
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
O tempo doado não é feito de resto
o tempo doado não é feito de pressa
quando se doa, doa-se por completo
qualquer ato abaixo disso
é sobra e não doação.

Fim III 
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Já fui feita de sonhos
Já fui feita de crenças
Agora sou feita de realidade
Aquela que me mostra onde exatamente andavam meus pés

Fim IV 
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Então, quando acordou
percebeu que ainda esperava
e decidiu que a espera não tinha sentido
porque era solitária e vã

Fim V
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Um pequeno áporo,
insignificante
impaciente
intransigente.
decide mudar.
Muda de ideia rapidamente,
o câmbio não terá validade.

Fim VI
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Que se dane a chuva melancólica que cai lá fora
Vá pro inferno a sensação de frustração
Quero meu sono
Quero minha vida
Quero minha alegria.

Fim VII 
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Ouço um lamento
que vem bem lá de dentro
Ouço uma gargalhada
que está há tempos se formando
e nela é que vou me fiar

Fim VIII 
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Chuva chuvinha chuvisco
Tempestade 
Leve esta saudade vã
Leve esta terra chã
e me coloque em coxilhas irregulares

Fim IX 
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
O navio leva sonhos
Carrega planos
Transporta corações
Em terra firme
maldades
saudades
ilusões

Fim X 
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Com amor escrevi em meu coração um nome
Amor de plástico, sem cheiro, sem calor
Roubei de mim momentos únicos
Louca que estava em descompasso
Ouço agora o meu próprio cobrar
Saudade não se tem do que nos fere.

Hoje não!
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Não estou para mim,
não estou para você,
tranquei-me em exílio
de tempo e de amor...

Mulher
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Debruçada na janela, qual rosa que descansa no galho da roseira...
Pensamentos voam longe, divagam para muito distante,
No lábio, um sorriso que se nega a sair,
Na testa uma ruga que insiste em ficar ali.
Mulher sonhadora de caminhos infantis,
não vê que o sorriso é necessário
para a lágrima não existir?
Deixe de lado as suas dúvidas
e não permita a testa franzir.
Faça da vida um bordado,
de cores fortes e ternas,
faça da espera um momento
que num instante se esvai...
Seu rosto moreno é luz
luz do sol a brilhar
sua pele são os raios
que não param de chegar.
Mulher de segredos mil
de desejos de outras eras
permita que sua vida seja
o doce momento da espera.



Somente uma flor
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Àquela altura, o pensamento que lhe vinha à mente era o de ser um monstro. É, diziam-na um monstro e, assim, queriam que ela se assumisse. Seria, de fato, aquela mulher, um monstro? Monstro este formado na rudeza de um amor mal acabado, no infortúnio de uma história que, desde sua gênese, foi mal escrita, por vidas que não se queriam juntas. A gênese desse monstro era anterior à existência dele, pois vinha de caminhos tão mal trilhados e, ainda na infância, esse ser, a que hoje denominam monstro, sentiu a herança perversa daqueles caminhos.
Na verdade, ela se sentia uma flor rara. Caminhava pela rua com uma firmeza nos passos antes nunca vista. Falava com uma segurança e uma certeza que assustavam os seus ouvintes. E justo por isso era um monstro. Dentro dela, porém, havia um oceano formado pelas flores mais aromáticas, havia uma onda que, a cada movimento, exalava um perfume raro que há anos estava em maturação. No entanto, ela se lembrava de que era um monstro.
Pensava em tudo o que havia dito, com tom firme e com segurança, ainda que algumas teimosas lágrimas insistissem em descer. Pensava nos relatos que saltavam de sua mente e se materializavam diante dos ouvintes. Tais relatos colocavam-na em um estado de tristeza pelo vivido e euforia por contar cada detalhe. Sabia que, por mais que dissesse, ainda haveria muito a dizer e muito a omitir. E pensava se seria um monstro ainda se contasse tudo, ou definitivamente, a flor, que estava certa de ser, seria revelada.
Nos passos daquela mulher, somente as mudanças a ela importavam. Seus ouvintes preocupavam-se com as transformações, por certo, porque incomodavam.
Ela estava imersa em um novo caminho, em uma nova vereda sem volta, ainda desconhecida, mas que não seria a mesma de outrem.
Flores, ela foi espalhando pela alameda em que trilhava para garantir que fosse se alastrando uma nova essência e seus passos fossem, ao menos, perfumados.
Por fim, como último pensamento, como quem esmorece e já não consegue mais proferir uma palavra sequer, ela buscou no fundo do seu coração uma resposta para sua condição e somente constatou que ela de fato era uma flor.

Pasárgada 
(por Claudia Vanessa Bergamini)
Em algum lugar em mim existe um espaço para viver o novo. Existe um continente imenso em que poderei provar uma bebida rara, degustar de um banquete de paladar adocicado e tenro. Neste lugar, os questionamentos constantes, as respostas intrigantes, as discussões incessantes não terão vez. Basta que chegue nele a brisa a acalentar a face, o orvalho a molhar os cabelos, o vento a refrescar a mente e a chuva para limpar o fardo para que eu sinta-me plena e livre de amarras sufocantes. Ainda poderei por nele algo de que necessito sobremaneira, trata-se de um herói. Herói este que desejo humano, cheio de defeitos, manias, ideias contrárias às minhas, as quais permitam deliberar, discutir; permitam que uma fermentação sanguínea nos mostre o quanto somos humanos e o quanto carecemos de tudo o que faz do homem, definitivamente, homem. Sim, existe este lugar! Ele está em mim e dá passos apressados para que os átrios recebam tudo o que nele posso e desejo colocar.



E agora, menina?
(Por Cláudia Vanessa Bergamini)
E agora, menina?
Acabou-se o conceito,
Fechou-se a janela,
Perdeu-se do grupo,
E agora, menina?
E agora, você?
E agora, menina?
O que será de você?
Correrá para onde?
Chorará em que peito?
Segurará em qual mão?
E agora, menina?
E agora, você?
Discurso você tem,
Desejos também,
Vontades aos montes,
Coragem a vender,
Então, menina, e agora?
Mate a menina,
Que nasça a mulher,
Que floresça a vida,
Que brote o sorriso,
Que exale a alegria.
E quando a noite,
com sua mão fria,
vier lhe tocar,
só lembre, menina,
que você já é morta,
porque agora é mulher!

Amiga
(Por Cláudia Vanessa Bergamini)
Estive com ela outro dia. Trocamos um abraço muito carinhoso e, de imediato, passamos a conversar sobre a vida e trocar confidências que só trocamos com quem nos sentimos à vontade e em quem temos confiança.
Como é bom saber que, na minha trajetória, há pessoas que passaram e permaneceram para sempre. A propósito, dona Silvana Vieira, já nos conhecemos há 24 anos e ainda damos as mesmas risadas da época em que nossas conversas eram embaladas por sonhos tão pueris. Ainda me lembro de como eram agradáveis às vezes em que podíamos nos encontrar e compartilhar uma do mundo da outra. É, ficamos maduras, isso é fato, mas preservamos o coração aberto para as pessoas que passaram por nossas vidas e permaneceram. Quando gostamos de uma pessoa, quando ofertamos a ela um lugar especial em nosso coração, pode o tempo passar, podem nossos sonhos se modificar, nossos rostos demonstrarem as nuances do tempo, ainda assim, os laços estreitos que nos une permanecerão.




Olhe-me!
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Olha em mim, homem a quem desejo, enxerga-me por dentro, ainda que possa ver-me por fora completamente. Atente-se para o que fazes comigo, mesmo que não queira, sou pele, sou desejo, sou brasa que a qualquer momento se torna fogo. Vê meu corpo, vê meu sexo, minhas marcas e o orvalho que de mim emana, mas veja os olhos que anseiam, as mãos que procuram, o coração que se perde por outros caminhos. Uma explosão, um jardim selvagem com flores em vigor, um amor, uma intensa gana de você. Olhe-me!



Teu corpo
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Assim como o rio deságua no mar,
teu corpo veio até o meu,
miragem, imagem, sensação...
Não! Não quero acreditar no visual.
Sou matéria, e como matéria, só creio no toque.
Quero fugir de sensações,
Quero pensar no que somente sinto.
Que ironia! Não sinto?
Sim, sinto teu corpo!
Em que pese essa distância insuportável,
Em que pese essa ausência de calor,
Em que pese o fato de eu ser materialista,
Quero o teu corpo,
Quero o teu calor,
Quero o teu toque,
Quero o teu cheiro conhecer.
E desbravar delicadamente cada parte desse continente até que em minhas mãos sinta tudo o que é seu: gosto, cheiro...
Quero nos envolver num inebriante jogo sensorial,
porque teu corpo é cor, é desejo, é um vai e vem de pele e formas que me levam ao delírio pela imagem.
Contemplar, admirar, desejar
a distância já não importa,
Valem sensações,
Vale imaginar um cheiro que desejo
Um gosto a que almejo.
Vale o que quiser para te sentir.
Vale o que puder para te tocar num vai e vem de mãos perdidas ao vento,
de boca úmida a percorrer toda a extensão deste corpo que quero conhecer.


E amanhã, quando a primavera chegar, encontrará um novo tempo, numa nova mulher, disposta a novos sentires, seja pelos poemas que com sua poesia inebriam a alma, seja com as flores que com sua beleza encherá o meu coração. 
(Por Claudia V. Bergamini)

Quando chegar...
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
A porta ainda se encontra fechada,
Mas sei que é uma questão de tempo,
porque aprendi que o tempo é necessário.
Quem sabe amanhã, ela já esteja entreaberta,
Com espaço suficiente para que a invadam os primeiros raios de luz e os primeiros sinais de um dia ensolarado e quente.
À medida que os dias se passem,
penso que os raios de luz se fortalecerão de tal maneira
a iluminar todo o ambiente.
O tempo poderá trazer de volta o sorriso
há muito perdido, as vontades deixadas de lado,
os sonhos abandonados ao acaso, enfim, a vida, para ser vivida.
Se um mês, um ano ou mais não sei qual o tempo necessário.
Todavia acredito que terá fim a espera.
E quando definitivamente chegar,
a recepção será com a luz que já tem insistido em invadir as frestas,
com o sol que já tem emprestado seu brilho e seu calor e estão a preparar o ambiente.


Caminhos
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Foto de Claudia Bergamini.A cada não que te digo,
corta meu coração uma faca
daquelas bem afiadas
que ao simples toque nos fere.
A cada vez que te nego,
ciente estou de negar uma história,
história que escrevemos juntos
com rabiscos, sem ordem, às vezes, ao acaso.
Se me entrego a teus pedidos
como posso me libertar eu?
Se corro para teus braços,
que caminhos serão os meus?
Entre cada dúvida minha
uma certeza a mim se apresenta
não há mais aquela menina
que simplesmente aceita.
Ela perdeu-se no tempo,
ficou morta para certas vontades,
perdeu-se em meio a uma história
que ela sempre pensou ser de verdade.
Entre dúvidas, medos e vontades,
agora venceu esta última.
espero que me perdoes ou entendas
pois já não posso mais ser tua.
O bêbado
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Vinha torto pela rua,
caminhar mal conseguia
mais uma noite, porém,
a vida seria de alegria!
Ao acordar já pensava,
que horas poderei beber,
tomar todas me é necessário,
porque tenho que esquecer!
As horas demoravam a passar,
o dia corria lento,
mas a hora em que caía a tarde
para o bar ia mais rápido que o vento.
Uma pinguinha para começar,
somente uma dose já lhe acendia,
o desejo tão ardente,
de esquecer a Maria.
Mulherzinha esquisita aquela,
uma hora lhe enchia de dengos,
em outra lhe fechava a janela.
E depois da boa pinga
que lhe queimava a garganta
havia estômago para outras
e deixa para lá o prato de janta.
Maria, Maria, menina,
pare logo de brincar,
este homem já não pode mais
viver a cambalear!


Sobre cuidar de rosas 
(Por Claudia Vanessa Bergamini)

Simples ir até o jardim e escolher a roseira que deseja fazer sua.
Simples ir ao jardim e separá-la para você.
Feita a escolha, inicia-se um processo.
Os meses de julho e agosto são os mais indicados para que as roseiras sejam podadas. E de fato são. Talvez agosto seja ainda melhor.
A poda somente pode ser feita depois que a roseira ofereça a rosa mais pura, mais bela.
Para tanto, dedicação é preciso.
Regá-la todos os dias com água fértil, de qualidade inquestionável.
Dedicar seu tempo a inspecionar cada pequeno espinho, cada detalhe das folhas e galhos.
Rosas gostam de se sentir seduzidas pelo seu dono.
O prêmio dessa sedução são as pétalas aveludadas e levemente perfumadas que, ao simples toque, deixam revelar as gotas de orvalho que nelas se escondem.
Ofertadas as flores, chegou a hora da poda.
Momento que saem todas as folhas e galhos em excesso e, ao passo que a roseira vai ganhando nova roupagem, seu dono já vê nela os traços que desejou lhe atribuir.
Quando alguém se torna o dono de uma roseira, torna-se também, o dono de seus espinhos.
Por certo que ela não tem pretensão nenhuma de ferir a quem ama com devoção.
Porém, às vezes, o sol forte do dia, bem como as horas e horas em que ela ficou exposta sem cuidados deixam-na com espinhos em evidência. Fácil resolver, é só dispensar a ela um tempo e o cuidado necessário que o dono só colherá a suavidade e a mansidão tão características dessa flor.
Rosas amam, e quando o fazem, despem-se de espinhos...


Por fim 
(Por Claudia Vanessa Bergamini)

Sempre resta para o fim algo muito mais do que especial, para ela, naquele instante, sobraram lágrimas. Não se assuste quem pensa que eram de tristeza. Não, não eram. Escorreram-lhe lágrimas que brotaram de uma alegria ímpar, rolaram naturalmente e se misturaram ao sorriso. Ninguém percebeu, nem mesmo a mais sensível das pessoas, mas as lágrimas saltaram-lhe dos olhos e molharam a face ainda rosada dos movimentos sinuosos de pouco.



Lição de casa
(Por Claudia Vanessa Bergamini)

E quando enfim vejo o bálsamo que duma explosão emerge, sei que há um química entre mim e você, talvez até uma química inexplicável, uma matemática ilógica e duas línguas distintas que convergem para a construção de uma única linguagem, a da sedução...



Palavras atrevidas
(Por Claudia Vanessa Bergamini)

Vou me entregar a você como poema que se escreve no ato do gozo, como verso que se faz a cada movimento do corpo em delírio e, quando as palavras brandas e puras já não puderem compor o mais belo poema, então, continuarei entregue usando o vocabulário atrevido e excitante que só pode em seu ouvido ser sussurrado.


Observações 
(Por Claudia Vanessa Bergamini)

Como o jogo que envolve a sedução é intrigante. Espera-se o outro, trocam-se palavras, imaginam-se situações, simula-se o êxtase mentalmente e, no momento em que ele pode de fato se concretizar, apenas se guarda o desejo para outro dia. Guardar o desejo é algo bom, porque amanhã ele estará maior, porque hoje, por sua vez, já esteve maior que ontem. Desejo vem de partes das mais impensadas, sem que se possa explicar ,ele vem. Pousa no corpo e na alma de forma leve e branda, como pássaro que visita o galho e levemente nele se assenta, como beija-flor que visita a flor e com doçura lhe colhe o mel mais nobre, como lábio que toca o vinho para lhe roubar o sabor tão esperado. Assim é o desejo. Quando se observa alguém a quem se deseja, estar-se-á diante de um movimento que envolve curiosidade, possessão sadia e uma vontade louca de gritar abertamente o porquê de tanta observação. Ando a espreitar, ando a desejar, ando a observar. No entanto, como concreto e seguro só ando a escrever...




Em que será que ela está pensando?
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Como adivinhar todos os pensamentos que povoam a mente de uma pessoa. Pensamentos vêm e vão porque são sonhos, porque já foram reais, porque se deseja que eles aconteçam ou somente porque são ideias, sentimentos. Alguns deles são tão ousados que sequer é possível ponderar abandoná-los. Outros são mais que ousados, são atrevidos, pertencem àquela família das ideias das moscas teimosas, as quais já andaram povoando a mente de personagens literárias de outros tempos.
Porém, à parte de serem as breves considerações um prólogo, vamos logo ao que interessa, a saber, no que pensava a moça naquele instante.
Ele lhe fez a pergunta em um momento em que a percebeu mergulhada no oceano que vinham de seus olhos. Ele notou que mais do que doçura, dos olhos emanava uma reflexão. Saber pontualmente de que se tratava seria impossível, mas não para ele, pois já havia aprendido a tirar dela verdades que ela não desejava dizer, descrever gestos, cenas ou narrar fatos que deveriam ser guardados. Naquele momento, a moça preferiu não revelar que ideias eram aquelas que tanto persistiam em ficar. Mas como ideias insistentes que eram, vieram parar aqui, neste pequeno texto em que se rabiscam linhas para expressar todo o universo que emana dos olhos daquela menina-mulher.
Ela continuou a contemplá-lo, com um amor sem nexo, porque todo amor é desprovido de nexo; continuou a ouvi-lo como quem ouve uma doce sinfonia. Para ela, ter a atenção dele significava ter muito mais do que de fato ela já havia conseguido. Pessoas são egoístas, não gostam de doar-se, tampouco de se preocupar com o outro. Ele não se mostrara assim. De modo algum, interessava-se, ao menos era o que parecia, na banalidade de vida que ela lhe mostrava. Interessava-se pelo mundo tão comum, tão cheio de mesmices que ela lhe desenhou. As conversas eram, por certo, cheias de encantamento para ela, para ele, talvez fossem somente conversas.
A pergunta para a qual ele, homem vivido em caminhos tão diferentes, construídos em estradas tão distantes, gostaria de uma resposta era muito simples de responder. Ela não entendeu porque ele não desvendou logo de pronto. Talvez, pensou a moça, ele já saiba, mas preferiu silenciar. Dentro dela um rio de sensações corria, convergia para caminhos ainda ocultos. As sensações careciam de abrir estradas, desbravar caminhos, podar árvores imensas que foram plantadas por mãos maldosas, a fim de ocultar o brilho do sol ou deixar baça a luz da lua. O pensamento dela, no exato instante em que ele indagou, era muito simples, daquelas simplicidades sem explicação, daquelas pseudo-simplicidades... Aquela mulher de olhar oceânico pensava na protagonista do conto que ela vinha ajudando a escrever. A escrita era ainda breve, uma escrita tímida em vivência e ousada em desejo. Todavia, pensava a moça no desejo de que o conto que estavam a escrever juntos se tornasse inexaurível e que de tantos e tantos que ele já escreveu, aquele fosse o último deles e ela se tornasse a sua protagonista.






Lições de como construir o amor
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Em tempos em que muitas pessoas acreditam que as relações se constroem a partir da atração física, porque compartilham dos mesmos gostos que o outro, a saber, balada, festas e muito mais, desde que seja superficial, gosto de pensar ao revés, ainda que compartilhe da ideia de que se sentir atraída pelo outro é indiscutivelmente necessário. Porém, do alto dos meus quase quarenta anos, prefiro buscar mais que gostosfúteis ou ligados a tudo o que seja efêmero. Gosto de pensar nas relações humanas como teias a serem tecidas diariamente, como uma cortina que, paulatinamente, vai sendo aberta e revela um palco cheio de encantos, de segredos, de novidades que, à medida que se conhece, deseja-se mais e mais conhecer e se aprende a amar a quem se conhece, a cada dia um pouco mais. E quando se pensa que já se ama o suficiente, surge mais surpresa ainda, porque se descobre que há muito mais a conhecer e, por conseguinte, a amar.
Quando se olha para o externo, em pouco mais de duas miradas, já se descobre o que há para ver. Pode-se, evidentemente, aperceber-se de um novo sorriso, uma forma diferente de tocar o cabelo, trejeitos que são necessários ao encantamento que o outro provoca. E de fato são.
Todavia, o que chama a atenção não é o exterior, que muitas vezes vem mascarado, cheio de recursos estéticos. Não, não é o exterior! O que me chama a atenção é aquilo que faz com que um ser humano seja tão especial, sua essência, a maneira como expõe suas ideias, a forma como articula seu pensamento, as novidades que surgem a partir de comentários, às vezes tolos, às vezes sem intenção de serem tão aprofundados. Descobrir o outro põe em prática a alteridade, a busca por tentar compreender, sem julgar, as atitudes e decisões, somente ouvir e se posicionar na pele daquele que narra suas experiências. Descobrir o outro é conhecer um universo e apresentar outro e constatar que, embora seus caminhos tenham sido sempre tão distantes, há tanto de igual neles, há tantas ideias que convergem para as mesmas veredas.
Há um universo a ser desnudado e nesse processo enxerga-se a si mesmo.
Não se pode precisar por quanto tempo o processo de descoberta será tão fascinante, mas se pode pensar que ele será chama a acender a cada conversa, a eternidade é uma questão de ponto de vista. Então, que seja eterno, já que é chama, e fascinante, pois há muito a aprender com quem tem a ensinar.


Mudanças... 
(por Claudia Vanessa Bergamini) 
Era uma vez um peixinho. Ele não sabia nadar. Ficava sempre num cantinho à espera de alguém para lhe salvar. Um belo dia, o peixinho cresceu. Descobriu-se capaz de nadar. Desde aquele dia, o pequeno ser nadou tanto, tanto que se viu em outros mares, rodeado por espécies e cores não conhecidas. Viu-se diante de perspectivas outras e águas tão sedutoras que deixou de nadar e voou...




Depois 
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Depois vem a sensação deliciosa de malemolência, uma vontade de ficar sem nada fazer, sem nada pensar a não ser lembrar daquele ato, daquele instante, do que foi dito, do que foi feito. Depois, e somente depois, é que o corpo se entrega a uma preguiça justificável, põe-se num estado de intocabilidade, num estado de preciso de novas forças para reviver o vivido. Depois, ah, o depois é o instante do êxtase mental, de reviver movimentos, gestos, reouvir palavras, é o momento de se colocar de novo pretensioso, porque amanhã se desejará mais e mais viver o depois.

Clepsidra
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Sempre acreditei existir algo muito maior que o tempo.
Acreditei na existência de instantes construídos em flashes sem intenções,
Acreditei, mas nunca constatei.
Claro, já fui daquelas que pensam a vida formatada, cada coisa a seu tempo
Mas, agora, diante de possibilidades, não posso pensar no tempo!
A água se esvai pelas mãos,
O sorriso se perde nos lábios,
O vigor foge ao corpo
O desejo torna-se preguiçoso e não mais insiste em ficar.
Então, para onde vão os momentos não planejados?
Perdem-se, como se perde o tempo na clepsidra,
Fogem, como foge a alegria do rosto,
Esvaem-se, como se esvaem os planos de outrora que jamais puderam ser postos em prática.
O tempo, ora o tempo...
Quem é que acreditava que tudo acontecesse morosamente?
Não existe mais esse alguém?
Um dia é suficiente para o prazer?
Uma semana é basta para conhecer?
Em um mês é possível amar?
Perguntas, perguntas, perguntas...
A resposta para tais já a tenho
Sinto-a a cada momento e sei que meu relógio pulsa para o agora, para o instante, o doce instante em que a vida se faz.
Foto de Claudia Bergamini.

Casa Limpa
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
A casa estava limpa, organizada da forma torta com que há anos vinha sendo organizada. No chão, tapetes de cores diminuídas abriam caminho para os passos tão ensaiados. As cortinas não tinham mais o colorido de outrora e tampouco serviam para tapar as frestas de luzes novas que insistiam em invadir o espaço. A mesa estava sempre posta, com toalhas já desbotadas, talheres riscados e sem corte, copos e taças judiados pelo uso, com pequenas marcas que apontavam lascas tiradas com o tempo.
Um dia, chegou à casa um visitante. Pediu licença para entrar e foi recebido pela moradora. Com receio, pouco a pouco as atenções se voltaram para ele, as histórias que contava eram sedutoras, as ideias que apresentava eram empolgantes e seu sorriso intrigava de uma forma arrebatadora. Sem se dar conta, os dias foram passando e o visitante foi ficando. A moradora não dispunha de meios para dizer que saísse. Às vezes, ela desejava que ele fosse procurar outra casa para se hospedar. Talvez uma casa com móveis novos, cortinas de um viçoso colorido, toalhas com estampas vivas e fortes. Em outros dias, porém, a moradora se colocava ansiosa para certificar-se de que o visitante estava ali e, ainda que os adereços fossem desbotados, muitas cores e formas poderiam ser esboçadas pela moradora.
Nesse ínterim, as horas viraram dias, os dias viraram semanas até que um mês se passou. Diante do desejo de acomodar de vez o visitante naquele espaço, a moradora achou por bem começar a trocar aquilo que a incomodava. Toalhas, cortinas, tapetes, móveis, começou a arquitetar um novo espaço em sua mente, a fim de que este se tornasse a casa colorida e com vida em que ela desejava viver. Porém, toda mudança requer o refletir, o sofrer, o envolver itens tão preciosos. Por isso, está a moradora entre o velho e o novo, entre a troca e a permanência, entre o colorido e o desbotado.
No fundo, bem no fundo, ela sabe que precisa daquilo que é vida. Ainda assim, mostra-se pacífica, resignada e se deixa levar por sentimentos de dúvidas que deveriam ter sido abandonados. Ela pergunta ao seu coração sobre o tempo em que o visitante permanecerá tão próximo. A resposta é inútil, porque ainda que vá, sua passagem já deixou pegadas, já abriu veredas e destas nunca mais será possível desviar-se. 
Entre o romper da manhã e o pôr-do-sol, a moradora anseia por mudanças. Serão reais ou a ilustre moradora já traz a insígnia de viver de forma desbotada?


Quanto há para ver em Londrina?
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Dediquei minha tarde hoje a passear pelo calçadão de Londrina e depois visitar aquele que seja, talvez, a expressão do que de mais popular temos na cidade, o Camelódromo.
Como é bom dar passos por caminhos que ficaram para trás, pois ainda que viva aqui, há muito tempo que a correria do dia-a-dia me tem levado a outros espaços, fazendo-me esquecer que o centro é onde vive a efervescência, onde circulam pessoas de todos os estilos, onde transita o povo; povo do qual também faço parte. Embora tenha sentido falta do velho coreto, que olhares, mais interessados na modernização da cidade do que na conservação de nosso passado histórico, julgaram por bem destruir, o calçadão ainda é o espaço em que circulam diferentes tipos sociais, onde a cultura popular se mostra viva, seja por meio de contadores de histórias, seja pelos enfáticos religiosos, o som da flauta boliviana que por aqui passeia, seja o moço a pular o círculo com as facas ou ainda o grupo de hippies que tornam aquele espaço único. Quem caminha por lá sabe que é impossível passar sem admirar cada personagem que faz do Calçadão o lugar cultural mais interessante da cidade. Não se trata de uma cultura clássica, mas sim de uma cultura que dá vida à cidade, que é sua alma que emana verdadeiramente do povo.
Depois de muito contemplar toda aquela formosura, que só valoriza quem sabe que o popular é a base de onde vieram ritmos, poemas, danças, músicas, decidi caminhar um pouco mais e ir a um lugar bastante diferente. Lojas que oferecem mercadorias diversas, que vão do luxo ao lixo, num espaço extremamente pequeno. Corredores apertados por onde se abre caminho com as mãos, ruídos, músicas de ritmos tão inusitados, roupas, equipamentos eletrônicos, decoração, sapatos, perfumes, maquiagem, instrumentos musicais, brinquedos e tantos outros itens, os quais não se pode nem enumerar. Impressionante a força que emana daquele lugar, são barulhos diversos, conversas, zunzuns, negociações, pechinchas, povo, povo, povo. Que delícia!
Ao sair de lá, não pude deixar de me render à delícia de pastel vendido na pastelaria mais tradicional da cidade. Ainda sobrou tempo para transitar por ela, a rua Sergipe. Correr os olhos por seus prédios antigos tão judiados pelas decorações comerciais. Ver a antiga rodoviária que tem servido de palco para exposições que nada tem a ver com o comércio popular em seu derredor. Caminhar pela calçada tão maltratada por carriolas. Mas nada disso importa, o que importa é saber que Londrina vive nesses espaços tão populares, saber que cada pessoa que por ali transita faz parte do que se chama cidade e, para além disso, são espaços que fazem essa cidade ser bela, ser única, ser a Londrina amada pelos paranaenses.


A moça que olha pela janela
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
A moça que olha pela janela não é somente a moça que olha pela janela. Quem a conhece na intimidade - e cabe dizer que raras são as pessoas que tiveram essa percepção - sabe que se trata de um ser humano a exalar alegria, determinação, coragem, inteligência, solidão, solidão, solidão... Ah! Mas para que serve a solidão quando se tem o dom de expressar em palavras cada desejo, cada pensamento, cada tristeza, cada lágrima, por meio de um simulacro tão doce que há quem diga ser somente uma fantasia?
Porém, a moça que olha pela janela sabe que o que escreve viaja para além da fantasia, pois já perpassou pelo caos de seu íntimo, pelas trevas de seu coração, pela luz que ainda brilha em seus olhos e pelo sorriso que, insistentemente, teima em ficar.
Às vezes, ela pensa que os dias frios, de inverno intenso, ficaram para trás, acredita que um novo tempo já foi anunciado e vem iluminado por um sorriso encantador, por uma risada contagiante e por uma voz sedosa, aveludada.
Em outros momentos, não tão confiantes, ela se volta para ela mesma, revive o vivido do inverno, ressente o sentido das madrugadas cinzas, reconstrói percursos que conduzem a veredas tão sem sabor, tão sem cor, tão sem amor.
Que pena! Porque os olhos da moça que olha pela janela vislumbram caminhos tão cheios de primavera, enfeitados por flores nunca dantes colhidas, por aromas ainda não sentidos, por toques que aguardam para ganhar vida, por olhares que carecem de se cruzar, porque, na verdade, sempre se buscaram.
Assim, entre uma dúvida e um desejo, entre o sentir e o esperar, o amar e o sofrer, o viver e o fantasiar, a moça continua olhando pela janela.
Não sabe o que está reservado para ela. Não sabe, ao menos, se existe realmente algo reservado para ela, pois lá no seu íntimo pensa que desde o ventre, desde o significado de seu nome, que aponta para aquele que anda com dificuldade, desde as trilhas que percorreu, ora sem querer, ora por escolha, desde sempre, a moça sabe que a ela cabe somente ser a moça que olha pela janela.
Foto de Claudia Bergamini.


O poeta
(Por Cláudia Vanessa Bergamini)
Ainda que descrever o poeta
Seja tarefa quase impossível,
Depois de muito viajar dentro de mim mesma,
Consegui uma modesta definição
Sobre quem acredito ser o poeta.
Trata-se de um ser humano nascido com um dom especial:
o de sentir o outro!
O poeta é aquele capaz de ler o que se esconde atrás do sorriso,
É capaz de identificar a alma que pede para ser desvendada,
O que sabe ler o rosto quando tenso e quando feliz.
Enxerga para além dos olhos,
Para além do toque,
Para além dos sentidos.
É o poeta aquele que põe em movimento todos os sentimentos possíveis,
Aquele que toca em feridas tão grandiosas.
Todavia, por suas palavras, faz perceber quão ínfimas elas são diante da grandeza da vida.
O poeta diz coisas altivas,
Mas é na pequenez de suas palavras
que consegue adentrar o universo chamado sentimento.
O poeta se sente poeta,
Porque no fundo sabe que seus olhos revelam o mais lindo dos poemas.
Em sua meninice, brinca de ser adulto.
Em sua maturidade, brinca de ser menino.
O poeta não escreve poemas,
pois sabe que dentro dele urge que sejam escritas todas as palavras
as quais vai colhendo pelos prados por que passa,
pelas veredas que atravessa.
Assim, não escreve, de modo algum, poemas,
antes, porém, o poeta escreve em palavras o sentir, o viver, o agir,
e consegue, em sua plenitude, descrever cada ocasião
com um cuidado e uma maestria tão grandes que,
ao ler o poema, é possível trilhar pelos mesmos caminhos
ou melhor ainda, sentir o desejo fremente de mudar de direção,
converter os passos rumo à poesia que se mostra tão sedutora
e pede para ser desvendada.
Qual a utilidade do poeta diante da vida?
Ora, a essa pergunta a resposta é sem dúvida:
O poeta é a vida em palavras,
É a alegria que pulsa,
A percepção que tenta se ocultar no homem,
A lágrima que insiste em ficar,
O sorriso que deseja saltar.
Poeta, poeta, muito mais do que ser poeta,
É você o domador de palavras,
O arquiteto do sentir,
O engenheiro do amor.

O poeta faz anos hoje....
(Por Claudia Vanessa Bergamini)
Como presentear a alguém que presenteia diariamente com palavras que são capazes de abarcar uma infinidade de sentimentos e sensações?
Como presentear a alguém que, mais do que palavras, empresta sua voz para amenizar dores, despertar amores, roubar sorrisos e suspiros constantes?
Difícil presentear-lhe, todavia, à minha maneira, escrevo-lhe estes versos, meio prosaicos, com o desejo que, de alguma forma, possa descortinar seus dentes brancos, arrancando-lhe um sorriso; possa deixar que seu dia se torne ainda mais especial; possa sentir-se lembrado...
Como presente, daqueles presentes sem valor material, mas que ficam para a posteridade, porque são palavras que podem ser para sempre guardadas, deixo este singelo texto, receba-o como forma de demonstrar meus sinceros votos de vida longa, saudável e feliz. 
Desejo que as veredas pelas quais trilhar não sejam de breu, antes, porém, sejam tomadas pela luz da lua, quando esta se faz nua e desejosa aos olhos.

O que eu quero?
(Por Cláudia Vanessa Bergamini)
Há muito o que desejar
Há muito a se pedir
De tantas possibilidades diante de mim
Somente uma me atrai.
O que eu quero?
Quero construir a infância que não tive
Quero sentir a meninice brincar em meus olhos
Quero o sorriso pueril que me foi tirado
Quero a beleza dos pés no chão
Quero a alegria de cabelos ao vento
Quero a boneca para ninar
A cantiga para cantar
A corda para pular
A vida para plantar...
De tantas outras possibilidades que desfilam aos meus olhos
Somente uma me atrai
O que eu quero?
Quero a adolescência florescente
Quero a risada despretensiosa
Os planos, planos e planos silenciados de volta.
Ah! Quantas possibilidades se perderam...
Quantas luzes apagadas
Quantas manhãs nubladas
Quantos ventos mal vindos me chegaram
E tudo o que desejava era em vão.
Diante de tantas escolhas possíveis
O que eu quero?
Atar as pontas da vida
Reconstruir a história ao revés
Desfazer os pontos tecidos no escuro, na solidão, na tristeza...
Frente a tantas escolhas
O que eu quero?
Quero a possibilidade menos provável
Quero rir o riso que não dei
Quero a palavra que não ouvi
Quero a entrega que não recebi
Que a verdade que não encontrei.
Quero ainda, o momento que não vivi
A flor que não ganhei
E tirar a cegueira para a qual me rendi.

Vou dormir...
(Por Claudia Vanessa Bergamini)

Vou dormir antes que o sol me desperte...
vou deixar que meu corpo se estenda sobre a cama e se entregue ao que ainda sinto do momento em que me fez mulher...
vou dormir antes que o dia venha me atormentar com sua deliciosa luz e me dizer que mais um dia nasceu para que eu possa alimentar o meu amor.
vou dormir sem temer que nada atrapalhe o gosto que ainda sinto, o meu sabor é o sabor adocicado do beijo que ainda não senti, do corpo cujo calor ainda desconheço, da feracidade que ainda não experimentei.
vou dormir um sono curto que bastará para me satisfazer, porque em mim não há tempo para o sono, mas sim para a alegria, o amor, a descoberta, a doce descoberta do outro.
Vou dormir, lentamente pegarei no sono, porque minha mente está tomada por tantas emoções, tantos devaneios que melhor é estar acordado que sonhar...
descanso o corpo e a mente, porque precisam estar prontos para o amanhecer...


Por que comprei flores...
(Por Claudia Vanessa Bergamini)

Hoje fui ao mercado, ao entrar, fui recebida com flores. Que alegria! Não se trata de uma flor qualquer, e também, vale esclarecer, não eram flores que me foram dadas. Porém, era para mim que elas sorriam. Era para mim que elas insinuavam uma beleza ímpar, a pureza do branco, contrastando com a alegria de um verde viçoso.
À medida que me aproximava do lugar em que estavam expostas, confirmava em meu coração que era para mim que elas se mostravam assim tão meigas, tão doces e tão sedutoras.  
Orquídeas, daquelas que simbolizam, segundo a lenda, paz e prosperidade. Prosperidade esta que vem anunciar a estação que se faz tão próxima, em pouco tempo, o cinza dos dias sai de cena e uma nova protagonista vem embelezar os dias com cores e amores.
Quanto de amor há em uma flor? E quanto de amor há em uma mulher? Estagnei-me diante da beleza que me servia aos olhos. Não podia sair dali, porque me senti a como a orquídea, bela, insinuosa, sedutora, pedindo para ser roubada, pedindo para ser a flor escolhida dentre tantas que embelezam o jardim. Entre mim e ela houve uma troca de sentimentos que pude ouvir o que ela tentava me dizer por meio de suas flores alvas. Dizia-me de quanto tempo ela precisou para ficar assim tão bela. De como o percurso pelo qual já trilhou foi de espinhos e de quanto aquele momento em que ela era contemplada e amada era único.
Diante dessa confissão, só me restou estender os braços e tomá-la para mim, porque me vi nela, porque me experimentei nela e porque, tanto quanto eu, ela sentiu-se seduzida, enfeitiçada por algo a que chamamos de amor.




Adormecida
(Por Claudia Vanessa Bergamini)

Havia refeito em sua mente cada sentir da semana que passara
Todos os caminhos percorridos, todas as explosões que teve
Seu corpo era tomado por uma sensação de repetição daquilo que já não mais a abandonara
No quarto, esperava o momento certo para poder iniciar um fascinante processo de entrega.



Ansiava pela solidão,
Uma solidão conjunta,
Uma solidão completa
Uma solidão cheia de uma presença ausente.

A espera, ainda que dentro de alguns minutos,
Fê-la adormecer.
Seu corpo, vagarosamente, foi se entregando a uma letargia,
Não conseguia mais pensar, nem agir, apenas se rendeu.

Todavia, não se pode esquecer dos anseios do corpo.
Então, em seu sonho, foi visitada da forma mais bela e doce
Pode tocar em flor, pode sentir perfumes, poder colher bálsamos.


Porque sonhos também são reais!
Porque desejos caminham para além da realidade!


Num quadro levemente adocidado pelo espírito da volição,
Ela, adormecida, entregou-se ao que mais lhe consome.
Corpo e mente, sonho e realidade
Tudo fantasia, tudo desejo, tudo vontade.


A fúria do corpo
(Por Claudia Vanessa Bergamini)

Há um abraço do qual não se pode fugir. Há igualmente um laço, cujo nó parece tê-lo atado para sempre.
Braços enlaçados, mãos que se encontram. O que fazer? É possível fugir? Há motivos para tanto? 
Quando a noite caiu por definitivo e já não se ouvia mais qualquer rumor, nem mesmo o som distante a anunciar que a cidade ainda tem vida, ela viu-se diante dele. Sentia por certo um carinho e um amor. Amor este ligado a uma felicidade longínqua, em tempos nos quais seus olhos não viam além. Olharam-se. Ele a olhou com desejo; ela, com sofreguidão. Não sabia explicar, não podia compreender, somente sentia que um lugar, um lugar muito diferente havia sido reservado para ela. A chegada a este lugar ainda era indefinida, desconhecida, mas haveria alguém, ela sabia que sim, que a poderia conduzir a esse espaço mágico.
Os olhares continuaram, cada qual com seu mundo, com seus anseios. Os corpos puderam tocar-se. As mãos dele percorreram cada parte do corpo dela e visitaram sua pele adocicada, sua pele apaixonada, sua pele sedenta por outras mãos. Depois, a boca dele pode sentir o gosto que lhe era tão singular. Gosto de mulher que se quer menina.
Enfim, quando ele já não podia mais fugir à vontade que se mostrava tão aparente, tomou-a nos braços, invadiu-lhe à sua maneira.
Ela, sonhadora que estava, viajando para um lugar ainda deserto, mas tão pleno dentro dela, só pode fechar os olhos e sentir.
Era o mar em movimentos bruscos, era a vida com sua força, seu vigor. Mesmo vigor que, outrora, saciou-a e ela agora tinha os olhos fechados para sempre em relação àquele momento, àquele sentir, ainda assim, ela rendeu-se ao que deveria fazer.
E o fez...
Rolou, movimentou-se, articulou-se e, em um instante em que eram apenas uma silhueta, ela tentou, desesperadamente, admitir que ali era seu mundo, seu lugar, sua vida.
Então, esqueceu por instantes qualquer possibilidade, esqueceu suas veleidades por novos rumos, em seu coração, tudo o que sobrara fora a resignação.
Explodiram os dois, corpos em fúria, mar em ressaca, vento abundante. Depois, ela fechou os olhos e pensou que aquele instante fora o seu instante, o seu mundo. Virou-se para o lado sentindo uma felicidade estática, conservadora, moldada. E dormiu...
Quando acordou havia um vazio imensurável a dominá-la e seu primeiro pensamento fora procurar o lugar em que tanto desejara estar.

Sobre a inspiração do poeta....
(por Claudia Vanessa Bergamini)

Não sei se sou poeta, mas sei que me sinto poeta.
Em meu olhar, ainda que não queira, capto cada movimento, cada gesto, cada sorriso e me debruço em busca de traduzi-los em palavras que possam expressar a beleza de cada instante, a sensualidade de cada movimento, a intensidade de cada sentir. 
Se sou ou não poeta já não importa, a mim importa somente o estado de ser e estar em mim em que me encontro.

Encontre-me
(Por Claudia Vanessa Bergamini)

Em meio a uma multidão, sinto-me perdida,
Ouço vozes e vejo movimentos que nenhum significado têm.
Em meus pés, sinto terra firme, de uma firmeza sempre igual.
Sinto líquidos que se esvaem com a lentidão que lhes é peculiar.



Em mim há uma curiosidade intrigante,
Há um questionamento incessante,
Há desejos delirantes,
E vontades tão distantes...


No silêncio, tão cheio de ruídos,
ouço ainda um sussurrar longínquo
deparo-me com palavras, talvez já ditas a outrem,
talvez escritas para mim...
Todavia, são palavras.


E muito mais do que palavras
são sinais que prenunciam mudanças
reais ou virtuais
basta que sejam mudanças

já não posso me encontrar,
já não posso me sentir,
há outros encontros e outros sentidos a que almejo
há outros saberes que busco
outros conheceres que me despertam.


Em mim, existe uma plenitude tão plena,
permitam-me a redundância,
uma plenitude que me faz somente pedir:
encontre-me!!!

Entre a razão e a emoção
(Por Claudia Vanessa Bergamini) 

Nunca fui romântica, aquele tipo de romântica que, ao simples olhar, já se coloca em meio a fantasias e devaneios. Gosto de meu lado realista, objetivo, direto e sem meias palavras. Ser assim, ainda que me faça afastar-me das pessoas, é uma forma de defesa. Defendo-me de mim mesma e de todos os medos que me envolvem. Sei quem sou, sei o que quero, sei exatamente medir cada sensação de calor ou de frio que passa por meu interior e, não raras vezes, fujo. Fugir, fugir, fugir... é um fugir que deseja ficar, é um fugir com vontade de ser segurada, um fugir cheio de sentimentos contidos, porque como realista que sou, os pés carecem de tocar em solo firme, de dançar uma valsa repetida tantas e tantas vezes, mas cujo compasso é sempre acertado. 
Desconcertos, ora, deixemos de lado os caminhos inseguros, a areia movediça, a terra que de tão encharcada faz os pés dançarem a cada passo. Brindemos a estabilidade, a segurança, a mesmice de todos os dias. Sim, brindemos a mesmice, porque é dela que se fazem os passos seguros, as fotos em que se pode sorrir, mesmo sendo necessário ocultar,lá do fundo, aquela melodia que extravasa a alma, aquela chama que move o desejo, aquele sorriso que só pode ser dado quando algo verdadeiramente nos completa. 
Não sei, desconfio que seja realista. A certeza, ao passo que permito sentir o que sinto, desejar o que desejo, acender o que deveria apagar-se, a certeza se me escapa pelos dedos, me escapa pela ponta da língua, pois a cada palavra proferida sinto-me deliciosamente romântica. 


Niebla
(Por Claudia Vanessa Bergamini)

Há um mistério em cada ser humano. Um mistério que nos impulsiona a desvendá-lo, uma vontade de descobrir todos os segredos para enfim, talvez, dizer: eis o fim de uma busca.

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